terça-feira, 19 de julho de 2022

Reescrever-se, por Thiago A.

Calei meus dedos durante anos, pensava que resolveria tudo na terapia. Falei, engolia meus comprimidos (dois ou três por dia) ora com água, ora com soda, mas quase sempre a seco. Enchia meu copo durante noites, esvaziava minha alma durante dias. Nesse percurso que chamamos de vida a cada dia que passava, na tentativa da patologização do não ser comum, de estar imponente todos os dias, me afastei da escrita.

Entendam que foram muito as batidas de portas pro meu coração, faz tempo, desde que me entendi um ser que ama, que construí degraus rumo ao nada, pois nada foi o que sempre tive. Naturalizei o estado de solidão calcificada e encarei meus desafetos com efeitos colaterais de benzodiazepinicos e a reação adversa foi a ausência do registro de desamores.

Parece que calado, todos me veem agora como uma fortaleza, o passar dos anos baseado em relatos alheios e em canções sertanejas me tornaram alguém que apenas observa, opina mas que recusa-se a pavimentar qualquer tijolo dessa escadaria de decepções.

Mas talvez o trânsito astrológico tenha me dado algum estalo ou a abstinência de medicação tenha me dado coragem e ousadia de desencapar esse livro de páginas amareladas que tornou-se meu coração.

Nos primeiros relatos e nas primeiras linhas eu identifico wi eu sou e quem tornei. Mas quero dar novos rumos pros escritos desse épico, quero que qualquer gota de amor se transforme em letras, frases, sonetos. Quero causar incômodo em cada leitor, quero revirar sua alma junto com a minha pra que no fundo eu saiba que todos dormimos sós.

E é com esse tom perturbador que gasto meus pingos nos is, gosto de causar incômodo, identificação, surpresas e dúvidas mas nunca dar a palavra final.