terça-feira, 24 de maio de 2011

Mulher Perdida, porThiago Almeida.

Sempre quis ser perigo, mas a vida só me fez mulher. Queria carregar grandes sonhos, mas nos meus pequenos braços só carreguei enxada e foice.
Na cidade grande; grande eu queria e dores grandes vivi. Aprendi a beber; bem mais que alguns homens feitos de ferro e dinheiro aguentariam - aprendi a amar. Aprendi o caminho de casa – mas já não existia um lar. Vivi bandida de crime algum; fui poeta de clandestinas estrofes. Fui a outra na cama de quem amor me dizia. Queria calar-me perante vida de tanto sofrer, queria de tanto sofrer calar esta vida vazia que me engole a cada dia. Vida voraz, sujeita avante, criatura imbecil e errante: dando escândalos nos bares, de maquiagem pesada e dormindo na calçada. Atire neste corpo sua ultima bala e quero que sejas certeira, quero que atinjas meu coração, quero ser só cérebro e razão por dois segundos que seja nesta vida. Cansei-me de ilusões!

Agora enterrada no fundo da terra – Só quero razão!

sexta-feira, 13 de maio de 2011

Princesa Ankita, por Thiago Almeida.

 Conta-se que em um reino muito distante chamado Sundara Dēśa, há milhões de anos vivia uma princesa chamada Ankita que possuía uma beleza jamais vista, diziam que seus olhos mudavam de cor de acordo com os ciclos da Lua, eram como pedras preciosas, cegavam quem muito neles tentassem penetrar e que também seus lábios eram detentores de desejo puro, homens iam à loucura ao ver e ouvir a princesa pronunciar uma palavra qualquer, juntamente com sua voz, que soava como um som celestial, uma harpa sagrada, capaz de transformar noite em dia e dia em noite. Em suas pinturas de rosto, misturava cores jamais vistas, que iam além do arco íris, seus cabelos negros e grandes brilhavam junto com o Sol - ninguém sabia quem mais brilhava. Era muitíssimo rica, vivia em seu castelo cercada de empregadas, se vestia com os melhores tecidos, diziam que possuía em seu castelo bichos de seda que também faziam as roupas de Deuses, enfeitava-se com todas as pedras preciosas que podia. Mas não era vaidosa. Qualquer um que a fosse seria, mas não Ankita.
Os anciões da cidade que viviam meditando no topo do Rio Sagrado, diziam que ela era a filha mortal da deusa Bhumi. Ankita só possuía um desejo em sua vida, casar-se e tornar-se mãe e perpetuar o amor recebido de Deus, ensinando seus filhos.

Ankita sabia de tudo que possuía, mas sabia de algo de muito valor que tinha que ia além de suas vestes sagradas, que suas jóias preciosas, que seus bens, que seu reflexo no espelho. Possuía Deus no coração

Príncipes de vários reinos distantes vinham lhe entregar presentes, lhe traziam jóias, pedras, ouro, especiarias, traziam-lhe flores, incensos mágicos, perfumes inimagináveis, espadas, poções mágicas. Certa vez um príncipe asteca, conhecedor da mais pura alquimia disse trazer consigo a poção da imortalidade.

- Eis que trago para a princesa, o mais precioso bem nos dado por Deus.
- O que é? Diga a Ankita.
- Uma poção, que farás com que sejas imortal.
- Es temente a Deus?
- De minha maneira, sim.
- Pois então deveria saber que somos imortais. Somos almas puras imersas neste corpo material. Este corpo acaba. A alma não. Pois Deus não tem fim, é mais inteligente que toda a alquimia. Não serás o nosso fim o sepulcro. Serás nossa perpetuação. É o que diz a canção de Deus. Sou imortal, este corpo para que olha não.

E este príncipe voltou para sua terra pensando nas palavras de Ankita e transformou os templos de alquimia em templos de Adoração a Deus.

Conta-se que em Sundara Dēśa as crianças brincavam com os anjos, que os animais falavam com elas e com quem mais quisessem ouvi-los, que as arvores saciavam-lhes com seus frutos se fome tivessem. Voavam em nuvens, adoravam a Deus com todo coração. Contava-se também que em noites de Lua Cheia, ela descia a terra para conversar com os humanos e os animais sobre como é a vida no reino celestial, junto a Deus.

No castelo, a princesa continuava bela e temente a Deus.

E alguns reinos, pessoas com desvio da palavra de Deus e não conhecedores de Ankita e de sua fé, achando-se no direito de julgar o próximo diziam que Ankita não queria casar, dizia que gostaria de continuar a receber presentes de seus pretendentes para que ficasse cada vez mais rica. Outros diziam que era uma bruxa, que sua aparência na verdade tenebrosa.

Uma vez uma empregada disse a Ankita sobre um destes boatos.

Ankita disse:

- O devoto de Deus, sabe como é grande a sua misericórdia e não deve se aborrecer se falam coisas que não são verdade. Não abra teus ouvidos a boatos demoníacos, pois abrirá tua vida para o demônio da discórdia, das desavenças. Abra seu coração às palavras de Deus e só ouvirá sua voz, mesmo que os demônios tentem lhe falar.

E voltou a rezar.


Os dias passavam, era inverno e um forasteiro chegou à cidade, com vestes brancas e simples, pensaram ser um monge, mas este se identificou como muçulmano, seu nome era Arshad. Dizia estar ali porque Deus havia falado contigo sobre Ankita, e que teria uma missão - unir para sempre os tementes a Deus em uma só nação.

As pessoas assustaram-se com sua audácia, pois o homem parecia não possuir bem algum a não ser poucas moedas suficientes para comida de alguns dias.

- O que poderá dar este mendigo a princesa Ankita?
Perguntavam-se os nativos da cidade.

Crianças observavam como o homem se voltava para o sul para recitar suas orações em uma língua diferente, tentavam imita-lo, e este sempre muito resignado em sua maneira, mas de uma doçura tremenda lhes ensinava com muito prazer.
Em uma noite contou histórias sobre seu país, as crianças, anciões da cidade ouviam com muito gosto e apreciavam muito a sabedoria daquele homem, mas ainda relutavam em pensar no que ele teria para oferecer para a princesa Ankita.
Depois de alguns dias em sua cidade, resolveu ir ao castelo de Ankita.Foi recebido por uma empregada que o conduziu até o salão principal, onde Ankita penteava seus cabelos recitando uma canção que ecoava pelas paredes do castelo e fazia com que os escritos sagrados ali desenhados dançassem aquela melodia transcendental.

- Quem deseja falar com Ankita? Disse a princesa.
- Sou eu Arshad.
- Arshad, bonito, o que quer dizer?
- Sagrado.
A princesa olhou fixamente nos olhos do rapaz.
- Soube que deseja casar-se, mas que só o fará com o homem que lhe trouxer o bem mais precioso de Deus.
- Sim.
- Pois aqui está princesa Ankita.


E entregou-lhe um livro com páginas de ouro e escrito com pó de diamante, o livro chamava-se Alcorão.

- O que dizem essas palavras?
- A palavra de Deus.
- O que diz este trecho em particular?
A princesa apontou o dedo em uma parte da escritura.
- Aqui diz “Louvado seja Allah Senhor do Universo, O Louvamos, Buscamos Sua ajuda e Sua orientação”.
- E aqui...
- “Fale a verdade, mesmo que ela esteja contra ti.” – a palavra de Deus.
- Eis que em minhas mãos está o bem mais precioso de Deus: Sua palavra.


A princesa ficou encantada e pediu que o rapaz lhe ensinasse aquele idioma, para que ela pudesse ler todo o livro sagrado. E passaram-se alguns meses até a Ankita resolver casar-se com Arshad.


Foi dada uma bela festa, nestes tempos os deuses eram tido como avatares de Deus. Personificações do poder divino, viviam na terra junto com os homens, não existiam continentes, a terra era uma só, dividida em diferentes reinos, mas una. Costumes, religiões, tipos de fé, diferiam, mas todas buscavam por Deus.

O casamento de Ankita foi celebrado pelos monges budistas, por muçulmanos, xintoístas, hindus. Vieram de reinos distantes os chamados Orixás, dizem que o Orixá Oxum, uma divindade dos Rios presenteou Ankita com muitos espelhos do ouro mais reluzente da terra. Vieram os Krishnas, os Cinco budas sagrados, os arcanjos, Salamandras, Elementais da natureza, Fadas, os Vedas, os Kamis, deuses de todos os lugares do mundo vieram prestigiar o casamento de Ankita, pois Ankita era fiel a Deus e conhecida de todas as divindades da humanidade.

Junto com essa celebração, Ankita contou a todos um grande segredo, ela disse que Deus lhe dera essa missão de casar-se com um homem temente a ele, e unificar todas as religiões e escrituras sagradas em um livro chamado de “Pūjā sabhī tarīkōṁ vē apanā nāma batāyā jā sakatā hai kī bhagavāna” , cuja seria a revelação Final de Deus para a humanidade, seria o contrato de boa convivência entre todas as nações e divindades da terra.
Esta noticia foi aceita com muita emoção por todos, que celebraram com um grande circulo de mãos dadas para adoração plena de Deus, envoltos por canções que aclamavam a existência do Criador com a seguinte passagem em diferentes idiomas “Deus é poderoso para manifestar-Se diante um devoto em qualquer forma, apesar dos devotos escolherem formas de adoração.” e assim foram dias de celebração.

Em um certo dia, Ankita foi a um outro reino junto com Arshad. E o castelo ficara só, então um demônio chamado Ḍ'āha com o propósito de destruir a paz existente entre todos os homens e a da terra roubou as escrituras de seu local onde em outrora havia designado permanecer: A casa de Ankita.̔

Ankita ficara transtornada quando recebera a noticia, não sabia o que fazer, mas não se entregou, orou a Deus e pediu a ele sabedoria. Muitos se sentiram perdidos sem o Kāma Sagrado. Ankita teve um pressentimento ruim, sentia que as pessoas deixavam o medo tomar conta de seus corações e cada vez este ocupava mais espaço do que os sentimentos inerentes a Deus.

Até que dúvidas surgiram, príncipes de outros reinos acusavam Ankita de roubar o Kāma para que ela pudesse ser a detentora de toda a palavra de Deus. Ankita se angustiava. Pessoas nas ruas gritavam, acusavam-na, gritavam palavras de ódio que perturbava a meditação dos Vedas e assustavam as divindades terrenas que passaram a receber oferendas para destruição alheia e não mais somente para bondade, saúde, alegria. A sociedade se corrompia bem como demônio quisera, deixou as pessoas cegas de ambição, ódio.
 Ankita não sabia mais o que fazer. Os deuses um a um iam retornando ao céu, pois a terra estava se tornando um ambiente impossível para vivência de seres tão puros e celestiais. As arvores não mais falavam, a Lua se calou, e os humanos cada vez mais distantes das palavras de Deus, julgavam Ankita como ladra, perversa. Arshad não resistiu a tanto ódio emanado das pessoas, das provocações, dos ataques, e ficou muito doente. Ankita então pediu ao deus Yama que desse uma boa hora a seu amado marido e este atendeu Ankita, levando seu Arshad para junto de Deus.

Os anos se passavam e a situação estava cada vez pior. Os conflitos não existiam somente pela dubiedade sobre o sumiço do Kāma, o ser humano tornou-se maléfico e sedento por sangue. Mas Ankita lembrava das palavras do Dharma “Eu apareço de tempos em tempos para proteger os bons, para mudar os malvados, e restabelecer a ordem no mundo para a rede de transmigração”.


Os dias em Sundara dēśa não eram mais os mesmos, Deus estava triste e ninguém notava. Toda prática religiosa ali praticada estava sem religiosidade alguma, o Deus-Vivo, tornara-se utopia. Até que em um dia de fúria e revolta dos deuses, houve uma tempestade que ficou conhecida como “Dēvatā'ōṁ kī bāriśa mēṁsū” que durou 5 minutos, mas dividiu o mundo tal como ele é conhecido hoje. A deusa Durga, desceu a terra para buscar Ankita, que renegou fugir dizendo: ām̐

- ó Adorada Durga, deusa da esperança, não posso fugir e deixar o meu povo destruído como está, a palavra de Deus diz:             “O protetor ideal possui firme, oposição rígida, para todos os malvados na sociedade. A obrigação (Dharma) de um protetor é de lutar contra toda a ação incorreta (Dadharma) e injustiça na sociedade.”

E pediu que lhe transformasse em um pássaro para que ela pudesse voar em busca do Kāma sagrado, para tentar reiterar a paz no seu reino e na terra.
Durga advertiu sobre todos os perigos a cada passo, sobre os perigos em cada ação, mas Ankita insistiu e então conservando toda a sua beleza, Durga transforma Ankita em um pássaro dourado de grande beleza, capaz de voar tão alto como jamais algum outro voou.

E finalmente depois de muita busca, ajudada pelos vedas de adivinhação, pelos oráculos sagrados, Ankita descobre que sobre uma influência demoníaca, o dirigente de um reino chamado Bhraṣṭa possui consigo o Kāma Sagrado. Ankita em forma de pássaro adentra o reino e tenta resgata-lo  para poder levar o mesmo as mãos de um Arcanjo que levará de volta a Deus, para que ele possa fazê-la retornar as mãos de um outro avatar de revelação.

O dirigente daquele estado ao descobrir que existe um pássaro dourado na cidade atrás do Kāma, pede orientação ao seu Guru, que lhe diz que este pássaro fora enviado pelo demônio para que ele tenha todo o conhecimento de Deus para um feiticeiro distante. Não sabia o dirigente que o próprio demônio era o Guru.

Então ordens de captura ao pássaro são passadas aos militares de todo o estado e capturam Ankita e levam-na ao dirigente.

- Então eres tu o pássaro enfeitiçado que viestes roubar o Kāma?
- Não importa se agora sou pássaro, já estive mulher, sou temente a Deus isto eu sei. E Não vir roubar o Kāma, vim resgatá-lo como tentativa de salvar a humanidade. Não percebe os males que estão se acometendo sobre nós?
- Como foi bem instruído, sabe até falar...
- Devolva-me o Kāma e levarei de volta a Deus, e a paz será restituída na terra.
- Jamais! Cale-se pássaro insolente! Vou mandar sacrificar-lhe, e pegar tuas penas e fazer um bonito adorno para mim.
- Podes até sacrificar este corpo de pássaro, mas não minha alma, tenho certeza do que sou e por mais que o senhor não acredite, um dia verá os frutos de estes teus atos pecaminosos amadurecerem e lhe será cobrado o preço por eles, clame a Deus e peça perdão antes que seja tarde demais...
- Cale-se! Como ousa me rogar pragas?
- Não estou rogando pragas, estou a lhe a falar a verdade...
- O que um pássaro enfeitiçado sabe sobre a verdade?

O dirigente se enfurece e pede que levem Ankita e o pássaro então é degolado. Todos ficaram surpresos, pois do corpo do pássaro não derramava uma gota de sangue sequer, mas sim um perfume de sândalo puro que se alastrou pelo ambiente.  Não era o fim de Ankita, era o seu nascimento para uma nova vida.

Logo após, ter assassinado Ankita o dirigente foi até a sala de leitura do seu Kāma, e abriu em uma página em que dizia: “O seu Deve-se considerar todas as criaturas como sendo nossos filhos. Esta é uma das qualidades de um verdadeiro devoto. Os sábios consideram todas as mulheres como sua mãe; outros, um montinho de terra como riqueza, e todos os seres como seu próprio ser. Rara é a pessoa cujo o coração se enternece pelo ardor da tristeza dos outros, e que se regozija ao escutar o mérito dos outros.”

Seu coração encheu-se de tristeza, pensou talvez o pássaro ter razão e não agüentando a dor de cometer uma grande injustiça perante a Deus jogou-se do alto do prédio do seu palácio.



Dizem que até hoje em suas reencarnações Ankita continua a buscar o Kāma, para tentar salvar a humanidade de todas as guerras e violência que conhecemos hoje em dia. Ankita pode estar do nosso lado tentando nos dizer o que nós esquecemos “Pūjā sabhī tarīkōṁ vē apanā nāma batāyā jā sakatā hai kī bhagavāna” ou seja “Adore o Deus de todas as maneiras que possam ser ditos teu nome.”